IA gera jurisprudência falsa e advogado é advertido por desembargadora
Um caso sem precedentes no Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) trouxe à tona os desafios éticos e jurídicos do uso da inteligência artificial (IA) na advocacia. Recentemente, uma desembargadora advertiu um advogado por apresentar um habeas corpus contendo jurisprudências inexistentes, aparentemente geradas por IA.
A desembargadora Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, da 5ª Câmara Criminal do TJ-SC, identificou que a petição inicial do habeas corpus parecia ter sido criada por inteligência artificial. Mais alarmante ainda, o documento citava "precedentes utilizados como reforço argumentativo que foram criados para induzir o julgador a erro".
Este incidente levanta questões cruciais sobre a integridade do processo judicial e a responsabilidade dos profissionais do direito ao utilizar ferramentas de IA. A advertência da desembargadora Schaefer destaca a necessidade urgente de diretrizes claras e fiscalização rigorosa no uso dessas tecnologias no âmbito jurídico.
Impactos da IA na prática jurídica
O uso de inteligência artificial na advocacia tem crescido exponencialmente, prometendo maior eficiência e precisão em tarefas como pesquisa jurídica e análise de documentos. No entanto, o caso do TJ-SC expõe os riscos potenciais quando essas ferramentas são mal utilizadas ou não supervisionadas adequadamente.
Especialistas em direito digital alertam que a geração de jurisprudências falsas por IA pode comprometer seriamente a credibilidade do sistema judicial. Além disso, tal prática pode ser considerada litigância de má-fé, sujeitando advogados a sanções disciplinares e prejudicando a reputação da classe.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) já se manifestou sobre o tema, recomendando cautela no uso de IA e enfatizando a importância da verificação humana de todo conteúdo gerado por máquinas antes de sua apresentação em juízo.
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Uso ético da IA na advocacia torna-se prioridade para entidades de classe. (Imagem: Reprodução/Canva) |
Regulamentação e ética na era digital
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem se debruçado sobre a questão do uso de IA no Judiciário. Recentemente, o órgão promoveu uma audiência pública para discutir a atualização da Resolução 332/2020, que trata sobre ética, transparência e governança na produção e no uso de Inteligência Artificial no Poder Judiciário.
O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), enfatizou a necessidade de novas balizas para o uso seguro da IA, especialmente considerando o surgimento de tecnologias generativas mais avançadas. A expectativa é que essas diretrizes contribuam para aumentar a eficiência da prestação jurisdicional, reduzir assimetrias informacionais e garantir mais equidade nos julgamentos.
Entretanto, críticos argumentam que a regulamentação deve ir além, abordando não apenas o uso da IA pelos tribunais, mas também sua aplicação por advogados e escritórios de advocacia. A criação de um código de ética específico para o uso de IA na prática jurídica é uma das propostas em discussão.
O futuro da advocacia na era da IA
Apesar dos desafios, muitos profissionais do direito veem a IA como uma ferramenta promissora para o futuro da advocacia. Sistemas de IA podem auxiliar na análise de grandes volumes de dados, previsão de resultados de casos e automação de tarefas repetitivas, permitindo que advogados se concentrem em aspectos mais estratégicos e criativos de seu trabalho.
No entanto, o caso do TJ-SC serve como um lembrete contundente de que a tecnologia deve ser uma aliada, não uma substituta do julgamento humano e da ética profissional. A formação continuada dos advogados em tecnologia e ética digital torna-se cada vez mais crucial para navegar nesse novo panorama.
À medida que a integração da IA no campo jurídico avança, o equilíbrio entre inovação e integridade será o grande desafio. A comunidade jurídica terá que trabalhar em conjunto para estabelecer padrões que garantam o uso responsável e ético da IA, preservando a confiança no sistema de justiça e promovendo uma advocacia mais eficiente e justa para todos.